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O delicado senso plástico do diretor Spike Jonze não passa despercebido em nenhuma de suas produções, não se trata aqui de análise do prazer estético de um viés pessoal, mas a habilidade de analisar como Jonze é capaz de mixar as várias vertentes que compõe um filme com maestria.
Seu último filme comercial para a Apple, sobre o HomePod, traz uma confluência de momentos que fazem com que seja uma obra prima. A maneira como ele cria uma sensação de complementaridade e simbiose entre a música, a atuação, a paleta de cores e mais importantemente ao cenário é o que faz com que seu trabalho entregue um sentimento de satisfação, como um jogo de tetris no qual todas as peças se encaixam sem deixar espaços vazios.
Atuação: FKA twigs / Música: Anderson Paak.
Esse trabalho de pensar o filme não como atuação mas como um remix de outras vertentes artísticas é o que o faz um diretor único. Ao observar seu trabalho como um todo encontramos esse traço em todas as suas obras, tanto no longa metragem HER (2013), em filmes publicitários como o World para a Kenzo (2016), HomePod (2018), e no clipe de Weapon of Choice (2001), de Fatboy Slim.
É interessante observar a importância do corpo e do movimento como fator direcionador do vídeo, como se os personagens de seus filmes fossem essencialmente livres e a câmera os seguisse pelo cenário que tem também um papel principal na contextualização emocional dos personagens. Em suas obras o diretor permite um nível de transparência tão grande em seus personagens que o que os move são suas mais genuínas intenções e sentimentos, o que faz com que a audiência se relacione com muita naturalidade aos mesmos.
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A dança é, numa brincadeira irreverente de palavras, a ‘Weapon of Choice’ do diretor, que escolhe por trazer a expressão dos seus personagens de uma forma que parece mais genuína no que um simples discurso, já que, como sabemos, muitas vezes as explicações não cabem em simples palavras. A subjetividade dos sentimentos é dificilmente explicada por uma construção textual, o que Spike Jonze faz aqui é uma ode à abstração.
Como em uma das falas mais icônicas de HER, Spike Jonze traduz essa confluência dramática denominada ‘ser humano’ em movimentos sinérgicos, como uma forma mais visual do que significa ‘ser’ e lidar com essa sequência de momentos que exigem ações e reações, como uma forma socialmente compreensível do que seria a existência daquele personagem.
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“Falling in love is kind of like a form of socially acceptable insanity.”
Ao trazer a ambientação, falando aqui em questões essencialmente da arquitetura e do design, para uma conversa direta com a história do personagem e não apenas uma contextualização histórica-social, mas também pessoal, o diretor permite um desenvolvimento gráfico da história, como vemos em ‘Apple: HomePod’. A solução cromática também é um fator complementar à expressão do ambiente nas produções do diretor, especialmente ao considerarmos a representação dos aspectos que constroem seus personagens, a ambientação construída é uma extensão de seus personagens, como se eles ocupassem o espaço físico não apenas através da sua forma presente, mas através de uma irradiação de suas personalidades que fica gravada em todo o cenário, refletindo diretamente suas relações com o próprio ambiente, consigo mesmo e com os outros.
As nuances que parecem como coadjuvantes na maioria das produções filmográficas aqui tomam proporções inesperadas e tem um papel ativo na construção e segmentação da história, ao assistir ‘World’ temos um exemplo claro de como o cenário, apesar de não ser um participante tão ativo – no sentido aqui de movimento mesmo – como ocorre em ‘HomePod’, tem um papel importante ao complementar a performance da atriz, quase como se ele dançasse com ela.
Atuação: Margaret Qualley / Música: Mutant Brain by Ape Drums (featuring Sam Spiegel and Assassin).
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