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Sobre ROMA

Foto do escritor: Ana Luiza de LimaAna Luiza de Lima

Atualizado: 24 de abr. de 2020

O mais novo filme da Netflix, que inclusive é um dos favoritos na premiação do Oscar, é em essência uma das películas mais bonitas que já vi.


O nome, embora nada tenha a ver com a capital da Itália, faz referência ao bairro de classe media homônimo da Cidade do México, mas ao longo do filme torna-se também claro as referências ao realismo italiano.

A história se resume, digo isso pois colocarei aqui de forma bem esdrúxula, ao relacionamento que se da entre uma família de classe média e sua babá e doméstica, Cleo. Através de um enredo bucólico Cuarón retrata as divergências dos dramas vividos por cada personagem e consequentemente como sua posição social influencia em todo esse processo. Há ali um contraste evidente e necessário, porém incômodo, que lateja do começo ao fim, sem ter qualquer chance de transformação.


A filmagem é elegante e a escolha de fazer um filme em preto e branco traz à tona essa necessidade de tornar visível as disparidades retratadas, a fotografia sempre ampla e distante traz a sensação da monotonia que acompanha a vida, fazendo com que o filme siga sempre uma ideia altamente realista do que é viver, distanciando-se totalmente das hipérboles hollywoodianas que tentam transformar cada acontecimento cotidiano em um evento único.



Com um tom extremamente sóbrio e consciente, a história de desenvolve sem necessidade de ter um começo-clímax-fim, ela segue uma linha que não exige resoluções, o que deixa tudo mais difícil de digerir.


Apesar de todas as pontuações sobre a construção plástica do filme eu, saindo do que seria o papel de crítico e enfrentando minha percepção mais pessoal do filme, não gostei de Roma.


A história me colocou em um local de desconforto, ou melhor, me revelou estar ocupando um lugar que eu acreditava já ter abandonado. As similaridades que existem da realidade retratada no filme e a vivência diária de muitas famílias brasileiras me deixaram incomodada, não acho ruim perceber a situação, porém o desagrado nasce da percepção de que muito tempo se passou e as mudanças são ínfimas.


Outro aspecto que me não me deixava desconectar da realidade é a tangibilidade cronológica da história, não há correrias, não há cortes e nem a necessidade de incursões no futuro ou passado, ou seja, ele não abre margem para a possibilidade de mudanças.


Escancarar verdades é um dos papeis da arte, venha ela no formato que for, mas convenhamos que lidar com uma verdade passada, transformada em fato histórico, é mais fácil do que encarar os processos não terminados que perpetuamos, mesmo sendo contraditórios ao discurso.


Assistir Roma é um exercício: olhar-se no espelho e despir-se do discurso, ver assim que as ações ainda se encontram distantes da realidade palpável.


É infantil dizer que há uma rejeição pelo medo de enfrentar a verdade, mas aqui eu encaro uma problemática maior, que não é a de ver o que se passa e sim mudar tudo isso. A sistematização, ou a inclusão de determinados comportamentos no nosso cotidiano e consequentemente no nosso entendimento de normalidade afasta a percepção das problemáticas.


O entendimento de que há mais desvios do que imaginamos é na verdade uma aceitação da condição da humana, mas essa só pode ser clamada se nos dispomos a remediar tais ideias, o errar só é humano quando seguido de um reconhecimento e uma reparação, lidar com o pesar também é necessário, já que não há, na verdade, uma reparação moral para tudo o que se faz de ruim.


Ser confrontado então com um problema tão pertinente e ainda tão presente apresentado pelo filme me faz ver que apesar de encararmos uma série de ideias que prometem uma sociedade mais igualitária, não estamos tão distantes daquilo que acontecia a alguns anos atrás. A herança histórica não ficou no passado, ela ressoa diariamente através de pequenas práticas, nos enganamos ao querer acreditar que o que passou, passou, na verdade essa necessidade de ‘superação’ nasce da culpa, da necessidade de fugir de determinadas responsabilidades que estão ali para nos lembrar que não somos bons como gostaríamos.



Existe aqui uma certa decepção, logo acompanhada de impotência, mas que se faz necessária para alçar um voo mais alto: a discussão de políticas de inclusão e de disparidades sociais só é válida quando os sujeitos dessa exclusão passam a ter voz, caso contrário, uma nova exclusão está sendo fomentada, baseada em responder apenas à necessidade de conforto emocional daqueles que a provocaram , para sentir que assim estão resolvendo algo.



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